quarta-feira, 6 de abril de 2011

Do que experimentamos nesta caminhada

UFRRJ, 19 de Fevereiro de 1997, à tarde. Experimentei hoje um momento muito interessante da minha curta existência. Marcou-me por sua originalidade, pelo ineditismo com que fui apresentado a mais uma das incríveis facetas do viver. Hoje, por alguns instantes, por alguns metros, experimentei, e pela primeira vez, a real e incômoda sensação de estar sozinho no mundo. Acompanhada esta de uma terrível sensação de vazio existencial. Sozinho e esvaziado.

Caminhava pela UFFRJ, do Prédio principal (P1) para o Instituto de Ciências Humanas e Sociais (ICHS); lia a cobertura jornalística do falecimento de Darci Ribeiro. Concentrado na leitura, segui meu caminho a passos muito lentos, bem calmos, enquanto era conduzido, pelo autor, pelos diversos momentos da vida e trajetória de uma das personagens mais brilhantes e marcantes da nossa história. Quando comecei havia sol, não ventava. Embora fosse à tarde, fevereiro, havia muita gente transitando pela Rural.

A notícia da morte já me causara um grande vazio. É muito ruim vivenciar perdas, e estas tomam contornos diferenciados quando se trata de pessoas cujos pensamentos, valores, envergadura moral e qualidade do trabalho as tornem imprescindíveis para a formação da nossa imagem de cidadão, da maneira como nos vemos e nos definimos como povo, nação. Embora conhecida a gravidade da doença, Darci Ribeiro desapareceu, simplesmente desapareceu. Fica a obra. O conteúdo da reportagem fez aumentar essas incômodas sensações; as palavras sensibilizavam, emocionavam, e, ainda que limitadas a um jornal, foram certeiras ao aludir a vida e obra de Darci Ribeiro.

Quando lia uma das últimas frases, onde Darci Ribeiro explicava ao médico porque sairia da UTI, abandonaria o tratamento e iria para casa, acontece o que marcaria para sempre este dia. Parei e comecei a refletir sobre o significado da sua explicação, sobre aquela contundente reafirmação da sua vontade de viver, ainda que implicasse a saída do hospital. Ele, paciente terminal, sai do quarto e vai pra vida; troca a paisagem da dor, pelo cenário da vida, ao lado dos seus e dos elementos que melhor definem o indivíduo que ele encerrou. Uma forte demonstração de amor a vida.

Fechei o jornal, levantei a cabeça e olhei para os lados. Pela primeira vez, aqui na UFRRJ, não encontrei ninguém. Ninguém ia ou vinha pelo caminho entre o P1 e o ICHS; ninguém vinha ou ia pelo caminho entre os alojamentos e o ponto do Colégio Presidente Dutra. Não notei qualquer pessoa que tenha passado por mim. Nada de carros, motos ou bicicletas. O tempo tinha ficado nublado, ventava muito; chuva forte a caminho. Demorou uns minutos até que alguém aparecesse. Retomei minha caminhada.

A caminhada, normalmente rápida, estendeu-se por quase 40 minutos. Eu estava sozinho, momentaneamente esvaziado do lúdico e do lírico que tão nobremente alimentam essa nossa breve caminhada pela vida e que sempre nos chegam por meio dos sonhos, apostas e obras dessas pessoas que são imprescindíveis.

2 comentários:

  1. Acabei fazendo essa caminhada junto com você agora...

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  2. Caramba.... sem palavras. Parece que nesse exato instante, ao ler seu texto, também experienciei desse seu momento onírico. Parabéns pelo texto. Parabéns pela sensibilidade dessa experiência!

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